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Dr. Eduardo Lagonegro

Reflexões sobre PrEP e PEP  Sob a Ótica da Bioética

O surgimento de novos métodos para diminuir o número de infecções por HIV, antes de ser uma inovação biomédica, traz muitos desafios. 

A busca por uma vacina preventiva anti-HIV tem se tornado um esforço compartilhado por muitos países, governos, pesquisadores e é muito desejada, uma vez que a epidemia continua a difundir-se mundo afora. Pela limitação do conhecimento e das tecnologias existentes no momento, perdemos no horizonte de curto e médio prazos, uma vacina que diminua as taxas de novas infecções por HIV.

Neste cenário surge a Profilaxia Pós Exposição (PEP) e a Profilaxia Pré exposição (PrEP). Trata-se basicamente de intervenções medicamentosas que diminuem ou mesmo impedem novas infecções por HIV em populações mais vulneráveis expostas ao vírus, e com taxas de soroprevalência muito diferentes quando comparadas à população em geral. Essas novas abordagens integram o contexto do “tratamento como prevenção”, expressão usada para definir a estratégia de uso de antirretrovirais para tentar impedir ou reduzir a infecção pelo HIV. Essa estratégia aparece dentro de um contexto de prevenção combinada.

Definições:

PEP – Profilaxia Pós Exposição – Estratégia de uso da terapia antirretroviral com intenção de impedir a infecção pelo HIV. O ideal é iniciar a medicação em até 2 horas após a exposição ao vírus HIV e no máximo após 72 horas após a relação sexual de risco consentida, violência sexual ou exposição ocupacional, com duração de 28 dias. Foi validada pelo Ministério da Saúde do Brasil em 22 de julho de 2015.

PrEP – Profilaxia Pré-Exposição – A Profilaxia Pré-Exposição ao HIV (PrEP, do inglês Pre-Exposure Prophylaxis) consiste no uso de antirretrovirais (ARV) para reduzir o risco de adquirir a infeção pelo HIV. A PrEP se insere como uma nova estratégia adicional de prevenção disponível no Sistema Único de Saúde (SUS), com o objetivo de reduzir a transmissão do HIV, validade pelo Ministério da Saúde em 29 de maio de 2017.

Na população geral brasileira a taxa geral de prevalência de HIV é de 0,6%, no entanto, na população de homens que fazem sexo com homens a média nacional é de 10,5%. São taxas muito diferentes, e refletem a magnitude que certas populações são assimetricamente afetadas. Se as estratégias de PEP e PrEP são uma realidade com vistas à diminuição de novos números de pessoas contaminadas, elas deveriam ganhar um debate mais técnico entre os profissionais de saúde, e em especial a categoria de médicos.

Infelizmente não é isso que vemos no dia-a-dia nos consultórios e serviços de atendimento. A visão em julgar o receptor da ação medicamentosa preventiva, seja ela pré-exposição ou pós-exposição ocorre com muita frequência. Exemplos não faltam para uma conduta de caráter não técnico: “Transou sem camisinha porque quis, por que agora quer tomar medicamento, arrependeu-se?” ou “Quer tomar medicamento pré exposição pra poder transar a vontade com a quantidade de pessoas que quiser? Por que não se controla?” 

Nessas colocações hipotéticas e que ilustram nosso dia-a-dia podemos notar o julgamento nas colocações citadas, ou seja, a situação não é percebida como factível pelo preceptor de medicamentos, como se as questões colocadas tangenciassem o ambiente da moralidade, abrindo um espaço para que o julgamento se instale.

Por que julgar? Faço-me sempre essa pergunta. O julgamento não deve morar no consultório médico por um simples motivo: NÃO AJUDA EM NADA ! O consultório não deve ser um espaço de julgamento.

O julgamento distancia o médico do paciente, e principalmente das questões que o estão afligindo quando procura um atendimento. O melhor auxílio se dá por intermédio de uma escuta atenta, e ajudando o paciente a tomar decisões naquele momento da sua vida, naquele contexto, ponderando benefícios e prejuízos. Não caberá ao médico as responsabilidades da decisão final neste caso. 

A decisão se dará entre o médico e o paciente, e eles devem ter o poder de decidir a adoção destas estratégias juntos.

Este cerne de tomada de decisão final por parte do receptor vai de certa forma contra a postura convencional do médico que foi formado, treinado e capacitado para dar a conduta final do que deverá ser feito. A postura reflexiva, desprovida de julgamento, deve servir como suporte e nortear a conduta a ser adotada naquele caso específico. 

A abordagem preventiva para a prática médica, ainda é de certa forma nova e recebe muitas críticas mesmo fora do ambiente das Infecções Sexualmente Transmitidas (ISTs). Exemplificando, não é raro encontrar profissionais médicos em discussões apaixonadas sobre administração de estatinas para controle de dislipidemia, e possível redução de progressão para doença coronariana. Apesar de estudos específicos na área com esse tema, a postura adotada neste caso é baseada na crença, pois ainda não existem marcadores específicos que apontem quem se beneficiará desta estratégia a longo prazo, abrindo espaço para a crença dentro do ambiente técnico. 

Finalizando, é de fundamental importância refletir sobre nossas crenças e julgamentos, pois a saúde de muitas pessoas podem depender desses fatores subjetivos em nossa postura médica.

In: Ética e HIV/Aids – Uma epidemia que se sustenta

Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo  – 2017

Eduardo Ronner Lagonegro

Médico Infectologista CRT – DST/AIDS

Mestre Infectologia em Saúde Pública

CRM-SP 59.820